Relato de parto natural - Gabi, Mike e Olivia


 É muito difícil começar o relato de parto no dia do parto propriamente dito, faltaria muita coisa importante. A gestação foi um processo longo e difícil, reclamei muito e sempre que tive oportunidade (e atribuo a ter sido 100% sincera com meus incômodos a leveza que tem sido o puerpério). Disse a quem perguntasse que não, não estava gostando da experiência de gestar e só queria que ela nascesse logo. Desde o início da gestação, o plano era um parto domiciliar, idealizei e sonhei muito que ela chegaria na sala da nossa casa, com uma mesa cheia de comidas gostosas e pessoas de confiança conosco, mas com 27 semanas fomos diagnosticadas com uma diabetes gestacional, um balde de água fria! O PD escorrendo pelas mãos e eu pensando nas possibilidades de ainda mantê-lo. Rolou um luto difícil de absorver pelo parto "perdido". Chorei as pitangas com a Rebeca (Rebeca foi nossa doula desde o dia da descoberta), mandei msg desesperada pra Ingryd, nossa eo, as duas me acolheram, me lembraram que não era pq não seria em casa que o parto seria ruim, conversamos sobre os riscos para Olívia, as maneiras para minimizar esses riscos e seguimos, o plano a partir de então era interromper a gestação com 39 semanas. Das 34 semanas em diante muita angústia, não racionalmente eu preferia que ela nascesse um pouco antes de 37 do que fosse necessário induzir, eu queria muito um tp espontâneo pq pra mim seria um sinal de que ela nasceu no tempo dela, e não no limite determinado para ela. Com 36 semanas comecei a usar a prímula, todos os dias, antes de dormir eu tomava um comprimido e inseria outro intravaginal, e ia dormir com a sensação de que naquela noite tudo ia acontecer, eu acordava grávida e frustrada no outro dia.  Com 37 semanas eu recebi o chá de bençãos que a Rebeca preparou e foi como tirar as angústias com a mão, me acalmei, mas todos os dias continuava dormindo pensando que era a última noite que eu deitava grávida. No dia 15/11, com 38 semanas e 4 dias tivemos nossa última consulta com a Ingryd, conversamos sobre as possibilidades, e eu disse que não gostaria de induzir, que queria adiar e a Ingryd me apresentou as opções e me tranquilizou dizendo que estaria conosco. Um medo que eu carregava desde que o PD saiu dos planos era de lidar com rostos desconhecidos no parto. Eu confiava na equipe do Sofia, que foi onde escolhi parir, mas me angustiava pensar em não ser o plantão da Ingryd que era quem havia nos acompanhado por toda a gestação e já sentíamos plena segurança. Quando ela disse que nos acompanharia foi como tirar um peso dos meus ombros. No dia 15, descolamos membranas para tentar estimular a Olívia a nascer e combinamos que eu iria no Sofia no sábado, que seriam as 39 semanas, para avaliar a vitalidade da Olivia com um cardiotoco e um ultrassom, se estivesse tudo bem iríamos induzir no domingo. Eu já estava com 3 cm e colo 60% apagado. Sai do Sofia dizendo que ela nasceria ainda naquela noite (aquela minha ilusão desde as 37 semanas permanecia kkk). Mas continuou não acontecendo nada além de tampão com sangue e o sábado chegou. Quando fomos pro Sofia no sábado eu tinha esperanças de chegar e a dilatação já ter aumentado, eu ia pedir outra tentativa de descolamento, mas imaginava a eo tocando e dizendo: “Vamos internar, você já está com 5 cm”. Mas eu permanecia com 3 cm, balde de água fria de novo,se os 3 cm tinham me animado muito na quarta no sábado eles me desanimaram... Mas ok, fizemos cardiotoco, ultrassom, tudo certo com a Olívia, bora pra casa que voltaríamos no outro dia cedo. Eu e o Mike saímos do Sofia conversando sobre como o domingo mudaria nossa vida, lembro de ter dito pra um grupo de amigas: não tô pronta, mas tô empolgada pra conhecer ela. Passamos no supermercado, eu queria comprar uns lanchinhos pra levar pro hospital já que a indução poderia demorar e queríamos comprar uma coisa gostosa pra nossa última noite de casal sem filho. Passamos na farmácia pra comprar umas últimas coisas e fomos pra casa. Saímos do Sofia às 18:50, chegamos em casa às 20:30.  Entrei em casa, contração. Passou, tudo certo, conversando, bem, racional, veio outra. E outra. Eu tive até medo de alertar o Mike de tanta expectativa que tinha criado de TP espontâneo que senti medo de ser coisa da minha cabeça. Enquanto elas vinham, eu preparava um patê que queria comer no parto e ia levar para indução no dia seguinte (até então). Eu percebi que elas estavam perto demais e pedi ao Mike pra marcar os intervalos. 2 minutos. Mas eu não conseguia acreditar, eu já tinha achado tantas vezes que tava rolando que não acreditava. Além de não acreditar, eu achava que estava racional demais para ser TP, conseguia conversar, seguia fazendo as coisas. Mandei msg no grupo, mandei msg pra Ingryd (ela tava no samba sendo feliz, me respondeu: "Agora eu entendi pq minha bebida caiu TODA no chão" ficamos devendo uma bebida e um samba pra ela), nos intervalos fiz o patê e recheei todos os pãezinhos, comi a carne que o Mike preparou e começaram a ficar mais intensas... Tentei o chuveiro em casa e ODIEI! Estava muito calor, impossível água quente e água fria era horrível. Desisti, tentei a bola, ajudava mas não muito. Depois de 2 horas com contrações de 2 em 2 minutos resolvemos ir pro hospital, lembro de no trajeto pensar: "É loucura parir no hospital sendo elegível pra PD, a transferência é uma merdaaaaa" as contrações no carro eram péssimas, não tinha posição que aliviava. Chegamos no Sofia e a recepção estava vazia, não tinha praticamente ninguém aguardando. Fomos avaliados e às 00:18 eu avisei no grupo que estava com 3 cm ainda. Eu fiquei ARRASADA! Tanta dor, tão próximas e eu ainda estava com a mesma dilatação da tarde. A Rebeca já tinha chegado mas ainda não tinha conseguido entrar, fui lá fora chorar minha frustração com ela e ela me lembrou: “As contrações tem duas funções, dilatar e posicionar o bebê, às vezes estão posicionando a Olivia primeiro”. Ela não me olhava com dó, olhava com orgulho e só o olhar dela me encheu de forças. A enfermeira propôs que ou fossemos embora ou aproveitássemos que já estávamos lá pra adiantar a indução. Decidi induzir, estava cansada, com dor, que resolvesse logo. A Rebeca não podia entrar enquanto eu estivesse induzindo, foi embora e voltaria quando eu fosse pra sala de parto, ficar lá sem ela foi muito ruim, mas hoje reitera que o trabalho mais importante de todos da doula é feito ao longo da gestação, mesmo sem a presença física dela, ela estava presente. Quando fui comunicar a enfermeira que tínhamos decidido internar pra induzir, enquanto aguardava ser chamada novamente minha bolsa rompeu. Fez um Ploc, e eu fiquei meio em dúvida, logo depois escorreu líquido pelas pernas. Quando fui avaliada novamente, poucos minutos depois da avaliação que me mandaria embora eu já estava com 4 cm, e a bolsa realmente tinha rompido. A enfermeira que passou o espéculo me ofereceu uma foto, segundo ela dava pra ver os cabelinhos da Olívia no colo do útero, desesperada no meio da contração não aceitei e me arrependo amargamente. Internamos para o pré parto e as contrações já estavam muito mais dolorosas, depois da bolsa romper, intensificaram muito. Cheguei no pré parto guiada pela enfermeira já perguntando se poderia tirar a roupa e onde tinha um chuveiro. Eu precisava de alívio. (Já tinha pedido morfina uma vez nessa altura do campeonato, mas não tomei). Acho que o enfermeiro do pré parto viu como eu já estava transtornada e de alguma forma me arrumaram logo uma vaga na sala de parto. Nem cheguei a ficar no pré parto, fui logo pra lá, chica da Silva. Entrei tirando a roupa e indo pro chuveiro, no chuveiro eu pensei: "Acho que dá pra lidar sem morfina" aliviou. Mas eu não tinha posição confortável pra ficar e pedi pela banheira. Logo encheram e eu entrei. Não falava com ninguém mais, não racionalizava, estava entregue. Só perguntava ao meu marido: Já ligou pra Rebeca , pra Ingryd e pra Mayka?,segundo ele nunca pedi tanto pra ligar kkk foram minhas únicas frases  Doía muito! Eu lembro de pensar algumas vezes que não ia conseguir. Depois de alguns minutos, a Ingryd chegou, eu lembro bem do alívio que eu senti quando vi aquele rosto conhecido e confiável. Chegou me trazendo açaí, eu tinha dito que tava com vontade na quarta e ela chegou com esse carinho. Ela sentou do meu lado na banheira, ela de um lado e o Mike do outro, cada um segurando uma mão e eu fiquei ali, tentava me concentrar nas contrações, e quando eu conseguia respirar direito elas passavam de forma mais amena. Mas aí as contrações começaram a doer na lombar, eu sentia que estava me rasgando e não tinha posição que aliviava. Pedi de novo pela morfina, a Ingryd me explicou que já não funcionava naquele estágio do tp, perguntei então se com anestesia eu poderia continuar na banheira e ela disse que com cateter não. Perguntei se dava pra fazer sem cateter e ela só me acalmou. Acho que ela já sabia que estava acabando, e eu havia colocado no plano de parto que mesmo que pedisse analgesia eu não gostaria de tomar. Comecei a sentir uma pressão muito grande no ânus, queria sair da banheira pra ir pro vaso mas o pensamento logo passou, falei pra Ingryd que estava sentindo ela baixinha e pedi pra ela avaliar, ela disse que não tinha necessidade de tocar e me sugeriu que eu mesma tocasse. Eu toquei e senti a cabeça da Olivia muito baixa, mas não acreditava que era ela. Perguntei pra Ingryd qual aspecto eu sentiria se fosse a cabecinha e ela me explicou. Na próxima contração eu toquei de novo, não estava convencida. Fiz isso por 3 vezes. Em cada toque eu senti a cabeça mais baixa. Mesmo com a pressão no ânus muito intensa, eu não consegui relacionar com o nascimento, na minha cabeça tinha um cocô gigante e quando eu conseguisse fazer o tp ia voltar mais tranquilo. Não me lembro as horas, mas eu comecei a sentir muita vontade de empurrar, eu achava que seria só o cocô. Vi a Ingryd se movimentando, pediu ao Mike pra enviar no nosso grupo que eu estava com puxos (a Rebeca e a Mayka, nossa doula e fotógrafa não tinham chegado ainda), minha ficha começou a cair. Mais uma contração e eu sentia que ela sairia na próxima, empurrei, descansei e veio mais uma, eu lembrava da fisio pélvica dizendo para não empurrar, deixar o corpo trabalhar sozinho, mas não conseguia não ajudar, foi involuntário, nessa contração a cabeça saiu, de uma vez, eu acariciei ela ainda dentro de mim, ligada entre os dois mundos, e logo veio a última contração, o corpinho saiu inteiro, de uma vez. Ela boiou, a Ingryd carinhosamente me lembrou: "Pega ela Gabi" e eu fui a primeira a tocar nela, eu olhava e não acreditava, não acreditava em como tinha sido rápido, intenso, maravilhoso. Dizia: "Nós conseguimos filha, conseguimos" Olivia ficou no meu colo pelo tempo que eu quis, no pele a pele, mamou ainda dentro da banheira e depois quando fomos ser avaliadas. Foi acariciada por mim e pelo pai antes de receber qualquer toque profissional. Logo que ela nasceu a Rebeca e a Mayka chegaram. Eu estava em êxtase, ainda me sinto em êxtase quando lembro.  Eu tive laceração de 1° e 2° grau que não precisaram de sutura. Os pães com patê que preparei a Rebeca me deu na boca enquanto eu segurava a Olívia. Me alimentei, tomei banho enquanto Olivia recebia os primeiros cuidados no colo do pai. E desde então temos passado os dias grudados, aprendendo com ela a cuidar dela. Parir foi a experiência mais transformadora da minha vida, mas só foi possível porque estive bem amparada desde o início da gestação. O que desejo pras mulheres é o direito de viver tudo que vivi com a plenitude que vivi. Sem serem desacreditadas, sem terem sua potência e força colocadas em cheque, nós somos a maior força criadora, o maior portal entre-mundos existente nessa terra! Um planeta inteiro.

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